A valorização da cultura
germânica é muito presente nas famílias da região Extremo-Oeste. A conservação
da língua escrita e falada, que passa de geração em geração confirma o cuidado
em manter a chama da pátria-mãe dos pioneiros acesa nas gerações seguintes. A
família de Vitor Giehl, de 42 anos, filho de Inge Giehl, de 66 anos, ambos
naturais de Mondaí, foi a segunda família a chegar em Porto Feliz e conserva
diversos itens e histórias dos antepassados, formando um museu particular com
objetos, fotos, documentos e equipamentos que foram utilizados pelos pioneiros
e repassados para filhos, netos e bisnetos. Natural do Sul da Alemanha, do
estado de Baden W?rttemberg, da cidade de Pfullingen o trisavô de Vitor, Johann
Adolf Fritz, sua esposa Marie Wilhelmine Barthold Fritz e suas filhas Anna
Fritz e Mathilde Grace Fritz, posteriormente casada Schultheiss, acreditaram na
promessa do novo mundo e embarcaram em um navio em direção a nova vida,
trazendo pertences pessoais que possibilitariam o recomeço no Brasil.
A bisneta do pioneiro,
Inge Giehl, conta que a chegada da
família a nova pátria foi cheia de surpresas. Com a Europa já desenvolvida, a
família estava acostumada com condições melhores de vida. “Minha família é
natural do sul da Alemanha, e meu bisavô viu um anúncio de uma terra muito
próspera, onde precisavam de pessoas com profissões para exercer lá, então ele
decidiu vir para o Brasil. Vendeu sua morada, mandou construir quatro baús de
madeira para acomodar o que pudessem trazer. Só que minha bisavó e minha avó
não queriam vir para uma terra desconhecida, onde elas não sabiam o que ia acontecer,
mas meu bisavô decidiu vir, e eles vieram. Meus bisavôs haviam adotado uma
menina, que veio com eles também, na época tinha 3 anos. Vieram de Navio,
“Dapfer Sierra Ventana” até o Rio Grande do Sul, onde já levaram um choque de
realidade com as pessoas simples e humildes, mas foram bem recebidos, inclusive
na língua alemã. Eles entraram no trem e estranharam os assentos de madeira, as
janelas sem vidraças e apenas com lonas, a pouca velocidade, na Alemanha já era
diferente, as coisas eram melhores. Chegaram na nova pátria, em Cruz Alta, onde
alugaram uma carroça até Panambi, e perceberam que as estradas eram cada vez
mais estreitas e cheias de mato”, destaca.
A adaptação à nova vida e
ao novo país não foi fácil. Não havia oportunidade de emprego e nem escolas
para as crianças, mesmo com os documentos que comprovavam a profissão exercida
na Alemanha e os anos cursados no ensino fundamental. No dia 03 de julho de
1922, Johann Adolf Fritz desembarcou em Porto Feliz, sendo um dos primeiros
colonizadores. Com experiência na Marinha, auxiliou nas viagens da embarcação
feita de timbaúva no ano de 1922. “Quando surgiu a oportunidade de colonizar
Porto Feliz, ele veio, sendo um dos primeiros homens a vir na canoa timbauva.
Como ele trabalhava na Marinha na Alemanha, ele tinha conhecimentos navais e
poderia contribuir na viagem. Em seguida, retornou para buscar a família,
chegando em porto feliz de 21 de janeiro de 1923”, recorda Inge.
FILHO RELATA EVOLUÇÃO DA
PEQUENA VILA
Para Vitor, filho de Inge,
os dados e objetos são naturais e fazem parte do dia a dia do professor. Ele
lembra que, conforme os relatos, cada vez mais e mais pessoas foram acreditando
no potencial de Porto Feliz. “A cada viagem da timbaúba, tinha uma pequena
balsa que trazia todos os materiais para as construções das edificações em
Porto Feliz, cada vez chegavam mais pessoas, geralmente solteiros em busca das
oportunidades que eram divulgadas pela empresa colonizadora. É oportuno
ressaltar que Marie Wilhelmine Barthold Fritz foi a segunda mulher que pisou no
solo de Porto Feliz, hoje Mondaí, enquanto a terceira mulher foi Mathilde Grace
Fritz Schultheiss, respectivamente trisavó e bisavó de Vítor. Chegou um tempo
que a casa do imigrante e o galpão não eram mais suficientes para abrigar o
pessoal, que começaram a se abrigar em cabanas nas proximidades até construírem
seus lares, mesmo que temporários”, argumenta.
Inge ressalta que a mãe e
a avó incentivavam a conhecer a cultura germânica. Por meio de um alfabeto
deixado pela mãe, Igne aprendeu a ler, escrever e falar alemão. “Eu nasci em
Mondaí, em 13 de julho de 1955. Sempre morei aqui, fui a escola e aprendi muito
com as vivencias aqui, com a minha mãe e minha avó. Meu pai é Erwin Baier,
pioneiro da década de 30, que chegou em companhia dos pais Gustav Helmuth Baier
e Karolina M?ller Baier, originários de Santa Cruz do Sul, anteriormente
residentes no norte da Alemanha em
Schleswig-Holstein am Stetin. Eu casei aqui, com um gaúcho de nome Enio
Roveder Giehl que veio para cá a trabalho, formamos nossa família, temos dois
filhos e uma neta. Quando eu nasci não tinha asfalto e nem calçamento, as
estradas eram todas lamacentas, as crianças iam para a escola caminhando,
alguns adultos também. Hoje eu vejo que muita coisa mudou para melhor, as
crianças têm transporte perto de casa, lanche na escola, roupas melhores”,
frisa.
A alfabetização das
crianças fazia parte da rotina das mulheres. Vitor foi alfabetizado pela mãe e
pela avó, que o incentivavam a ler e buscar conhecimento.O cenário da infância
em Mondaí ficou registrado na memória do professor. Lavouras, potreiros,
uniformes escolares, que se transformaram em asfalto e progresso. “Quando eu
era criança, ali onde tem a Móveis Henn, eram potreiros. Os grandes bairros não
existiam, era estrada de chão, depois passou para calçamento e agora asfalto, é
uma evolução constante nestes 100 anos de história. Uma longa caminhada”,
relembra.
RICO ACERVO HISTÓRICO
O acervo da família
possui mais de 200 itens, que contam histórias da Primeira Guerra Mundial, da
crise na Alemanha, da viagem para o Brasil e a continuação da vida aqui, que se
entrelaçam com a história da colonização de Mondaí. “Esse acervo que temos
conseguimos preservar muitas coisas como louças, livros, documentos, baús, e se
preservou porque a família era pequena e sempre foi cuidado com muito carinho.
Minha avó foleava os álbuns de fotografia com uma régua, e as crianças só
podiam ver, não podiam manusear. Olhando para o passado, percebo que nós damos
muita ênfase para os homens e às vezes esquecemos do papel fundamental da
mulher na colonização, que além de auxiliarem os maridos nas lidas do campo,
tinham o cuidado da educação dos filhos, do trabalho doméstico, repassar a
religiosidade, os ensinamentos culturais da Alemanha, as vivencias, sempre houve
uma preocupação muito grande nesse sentido, e é por isso que temos esse acervo
guardado e todas essas histórias ainda
vivas em nós, inclusive algumas destas histórias estarão inseridas em um dos
três capítulos do livro centenário de Porto Feliz, da qual orgulhosamente Vítor
é um dos autores, sempre contando com a valora colaboração de sua mãe Inge e de
sua irmã Mônica”, finaliza o professor.
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