Sobre xenofobia em SC: "Aqui o 'outro', o 'diferente, é, muitas vezes, simplesmente ignorado"
Última atualização 9 de novembro de 2015 - 09:02:15
Muito se vem falando sobre racismo em Santa Catarina, principalmente após o homicídio brutal de um haitiano em Navegantes. Como um carioca de 29 anos, que vive em Florianópolis desde 2006, ou seja, cidadÃo “entrelugares” que passou mais tempo da vida adulta em Santa Catarina do que no Rio, mas que ainda visita a terra natal frequentemente, vejo a questÃo do racismo aqui muito atrelado ao conservadorismo histórico local, à noçÃo de pertencimento a uma regiÃo vendida como “diferente” do resto do país, e ao momento de radicalizaçÃo política no Brasil. Tudo isso vem formando um caldo cultural perigoso, que, se é exagerado e errado estigmatizarmos Santa Catarina como racista, precisamos, por outro lado, ligarmos o sinal de alerta com a situaçÃo atual.
Quando eu vim morar aqui, via todo esse conservadorismo como fanfarrÃo, caricato e que acabava fazendo mal apenas para nós mesmos. Hoje, com a noçÃo de polarizaçÃo ideológica fortemente encrustada na populaçÃo e um congresso conservador como nunca tínhamos visto, muitas atitudes e declarações cotidianas que possam ser tipificadas como racistas e xenófobas têm sido naturalizadas. Mas nÃo é aquela coisa “escrachada” de ver ofensas e injúrias dirigidos ao outro, como “macaco”, como no Rio. Aqui o “outro”, o “diferente”, é, muitas vezes, simplesmente ignorado.
As pessoas têm parecido mais violentas e arredias. Amigos meus de muitos anos, nativos, estÃo irreconhecíveis nas suas ideias. E esse racismo velado é, no meu ponto de vista, extremamente negativo, às vezes pior que o “escrachado”, pois ele nega qualquer tipo de convivência, de aproximaçÃo, ele desumaniza o outro. Pessoalmente, passei poucas vezes por estas situações, mas aqui tive realidade social relativamente confortável, um emprego razoável como analista de telecomunicações que facilmente me “disfarçava” como um cidadÃo de classe média, e acho que isso conta muito para ser bem aceito nesse clima “meritocrático” de Santa Catarina.
Discordo das críticas dirigidas ao estado quando elas evocam uma certa ignorância nativa. Aqui, num primeiro momento, as pessoas sÃo mais fechadas, mas, em compensaçÃo, quando você faz amigos, é amizade de verdade, e nÃo raro você passa a ser considerado membro da família de algum amigo seu. Discordo também do estereótipo de “paraíso” da qualidade de vida: saúde, belezas naturais, educaçÃo, segurança etc. NÃo me sinto nada seguro por aqui. Em relaçÃo à saúde, nÃo sei se o que falam é a estrutura pública ou o fato de as pessoas buscarem uma vida saudável. Se for estrutura pública, realmente, o SUS aqui me parece ter um funcionamento acima da média nacional. Sobre essa de “vida saudável”, vejo como uma sutileza da busca desenfreada por atingir alguns padrões de beleza, e nÃo consigo atrelar isso ao fato de “viver bem”.
No mais, eu gosto muito de viver aqui, mas reitero: para mim é bom por causa das minhas condições sociais e porque eu venho conseguindo relativizar algumas opiniões e atitudes mais extremadas. Gosto do clima, tenho ótimos amigos pelo estado, e consigo, em período letivo da Udesc, ter o oposto do que eu tenho nos período de férias no Rio. É um bom contraponto. Para outras pessoas, já nÃo sei.
NÃo indico amigos a virem morar aqui para tentar “fazer a vida”. Indico Santa Catarina apenas para os que já “têm a vida ganha”.
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