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Insônia: especialistas alertam para riscos de remédios inadequados

Última atualização 16 de abril de 2023 - 20:27:52

© Marcello Casal jr/Agência Brasil

“Minha insônia começou quando
mudei de trabalho e passei a ficar 100% home-office” [escritório de casa]. O
que poderia ser uma facilidade foi o início dos episódios de insônia para a
jornalista Poliana Bollini Marques, de 49 anos. “Apesar de todas as facilidades
e de não precisar mais acordar antes das seis horas da manhã, meu horário de
dormir ficou bem complicado e só conseguia adormecer por volta das três da
madrugada”, recorda.

Poliana conta que ficou um tempo
sem se tratar. “Fiquei um bom tempo assim e atribuindo a insônia a mudança no
trabalho. Eu simplesmente não tinha sono. Até hoje é muito raro. Mesmo quando
ia dormir tarde e acabava acordando cedo, durante o dia não sentia – e ainda
não sinto – sono”.

O Estudo Epidemiológico do Sono
de São Paulo (Episono), conduzido pelo Instituto do Sono, apontou que 45% das
pessoas queixam-se de insônia ou dificuldade para dormir em São Paulo. A mesma
pesquisa revelou que 15% dos paulistanos sofrem de insônia crônica.

A insônia é definida com a
insatisfação em relação à qualidade eou quantidade de sono, podendo se
manifestar como a dificuldade em iniciar o sono, assim chamada de insônia
inicial; dificuldade em manter o sono: presença de despertares ao longo da
noite, chamada de insônia de manutenção; ou pode se manifestar por um despertar
antes do horário previsto, com dificuldade de retornar ao sono, chamada de
insônia do despertar precoce.

“A insônia crônica é quando
acontecem episódios pelo menos três vezes por semana durante o mínimo de três
meses, com consequências diurnas, associada à perda de concentração, alteração
de memória, irritabilidade, perda de produtividade, normalmente consequências
desse sono fragmentado”, explica a pneumologista e especialista em sono Luciane
Luna de Mello, do Instituto do Sono. Um período inferior a este, isto é, por um
mês ou menos é insônia aguda.

A insônia pode estar associada a
outras doenças como depressão, ansiedade, doenças neurológicas e situações de
dores crônicas, por exemplo. “Além disso, também pode estar associada a
hábitos, comportamentos inadequados que não favorecem o relaxamento e o início
do sono como o uso de excessivo de telas – especialmente próximo do horário de
dormir, consumo excessivo de café ou bebida alcoólica, alimentação pesada ou
gordurosa antes do horário de dormir”, disse a neurologista Marcia Assis,
vice-presidente da Associação Brasileira do Sono (Absono).

A prática de atividade física
próxima ao horário de dormir e as condições do ambiente de dormir como
temperatura e ruídos, ou ainda ter um parceiro de cama que ronca, podem
perturbar o sono, completa a neurologista. “Até mesmo outra doença do sono pode
estar associada à insônia e causar a piora da qualidade do sono como a Apneia
do Sono”, acrescenta a neurologista.

Impactos

“A insônia tem um impacto
absolutamente importante na sociedade, impacta no dia a dia, na produtividade e
na saúde das pessoas”, alerta a médica Luciane Luna de Mello, do Instituto do
Sono. Segundo a especialista, a insônia ainda pode diminuir a imunidade e
piorar a condição clínica. “Esses indivíduos podem ter ainda uma
irritabilidade, inclusive com quadros neurológicos ou psiquiátricos associados
a esse processo de insônia, que podem gerar processos psiquiátricos. Outras
vezes a insônia é gerada por doenças psiquiátricas, como causa secundária”,
explica.

Poliana Bollini Marques procurou
ajuda quando percebeu os prejuízos que a falta de sono causava durante o dia.
“Muito cansaço, memória ruim, um pouco de irritabilidade e pouca produtividade.
Fora o incômodo, tristeza mesmo, de ficar acordada todo dia até às três horas
da manhã”, relembra.

Mas, antes de procurar ajuda, ela
tentou medicamentos por conta própria. “Fiz uso de melatonina sem prescrição
médica. Foram meses tomando e nada de resultados. Achei que melatonina era para
insônia, mas hoje eu sei que ajuda em casos de jet lag [mudança de fuso horário
que provoca alterações dos padrões de sono], por exemplo. Melatonina não é
tratamento para insônia. Além da melatonina, tomei remédios fitoterápicos. Como
um só não funcionava, às vezes tomava dois ou três. Nada adiantou”, conta a
jornalista.

Mesmo com tantas ofertas de
medicações para induzir ao sono, a automedicação não é uma solução a longo
prazo, explica a especialista Luciane de Mello. “Muitos indivíduos com
automedicação chegam no consultório até viciados em remédios que não vão ser os
mais adequados para aquele quadro”.

Entre os medicamentos tomados por
conta própria estão os fitoterápicos. “Muitos fitoterápicos não têm o efeito
sobre o sono adequado, muitos não têm confirmação científica de que atuam sobre
o sono. Na literatura [médica], o que tem uma confirmação melhor é a valeriana
[planta medicinal]. Mas tem que ser adequada para um quadro leve de insônia ou
para indivíduos mais jovens”, observa Luciane.

A médica adverte que as
medicações não são isentas de efeitos colaterais. “É preciso ter cuidados
porque toda medicação é substância química e, mesmo a substância natural tem
suas substâncias intrínsecas e que vão fazer algum tipo de efeito, algumas
consequências relacionadas ao uso indiscriminado e em quantidades que não devem
ser usadas”, frisou.

Melatonina

“A melatonina não é uma
substância recomendada para o tratamento da insônia”, alerta a neurologista
Marcia Assis, vice-presidente da Absono. “A melatonina é um hormônio e não é
utilizada para tratar a insônia”.

A especialista esclarece que
existem doenças do sono e situações médicas especiais que a melatonina pode ser
indicada pelo médico, “porém, não deve ser usada por conta própria e menos
ainda para tratar a insônia, pois não é recomendada. A tentativa, sem
orientação, de tratar a insônia pode apenas mascarar os sintomas e provocar o estado
crônico”, adverte a neurologista.

Márcia ressalta que existem
medicamentos aprovados e recomendados para os diversos tipos de insônia, mas
que o tratamento considerado padrão ouro para a insônia é a Terapia Cognitivo
Comportamental para a Insônia (TCC-I).

“As terapias medicamentosas e não
medicamentosas podem ser associadas. Deve-se lembrar que a TCC-I é realizada
pelo profissional da psicologia especializado em sono. Além disso, a higiene do
sono dever ser estabelecida para os melhores resultados”. 

Tratamentos

Poliana vem se tratando com a
TCC, indicação de uma otorrinolaringologista, 
especialista em medicina do sono. “Foi um divisor de águas! Ela me
orientou, me ensinou sobre a higiene do sono e fiz Terapia Cognitiva Comportamental.
Também procurei uma psiquiatra, pois a pandemia prejudicou ainda mais meu sono.
Hoje, tomo uma medicação, o cloridrato de trazodona, e faço acompanhamento com
a psiquiatra e a psicóloga”.

Para ela, o que falta agora é
fazer exercícios físicos, “pois eles ajudam muito em toda a nossa saúde. Além
disso, tenho 49 e anos e percebo que estou entrando na perimenopausa. Outra
fase que mexe com o sono. Vou incluir a ginecologista nesta etapa como mais uma
ajuda para cuidar do meu sono. Me sinto muito melhor, mas ainda tem ajustes,
pois as fases da vida estão mudando e é preciso prestar atenção, sempre”,
alerta.

A terapia tem como base a higiene
do sono, um conjunto de práticas que prepara o organismo para dormir. Entre as
orientações, os especialistas indicam aos pacientes sair da cama, quando
despertam no meio da noite, ficam ruminando ideias e não conseguem dormir. Em
outro ambiente, devem se dedicar a uma atividade relaxante, como a leitura de
um livro, meditação ou realizar técnicas de respiração para que mudem o
pensamento e consigam adormecer. “Assim, o cérebro vai associar a cama ao sono
e não à insônia”, ressalta a médica Luciane Luna de Mello.

 Higiene do sono

Para todos que apresentam insônia
ou não, cuidar dos hábitos antes de dormir é fundamental para uma boa noite de
sono. Baseadas na higiene do sono, as médicas Luciane Luna de Mello e Marcia
Assis mostram como hábitos adequados podem ajudar as pessoas a dormir melhor.

• Mantenha uma rotina: estabeleça
horários para o sono, a alimentação, os exercícios físicos, o lazer, o trabalho
e as atividades com a família.

• Não leve o notebook ou celular
para cama: Eletrônicos provocam aumento do estado de alerta, além da
luminosidade dificultar o início do sono.

• Desacelere antes de dormir:
pelo menos uma hora antes de se deitar faça uma atividade relaxante: tome
banho, leia, ouça música, faça meditação ou qualquer outra atividade que ajude
a desacelerar.

• Evite permanecer na cama
trabalhando, lendo e-mails, assistindo TV. Reserve este momento para atividades
que provoquem relaxamento. Deite-se somente quando estiver com sono.

• Evite alimentos pesados e
bebidas com cafeína:  faça refeições
leves até duas horas antes de deitar. Não tome café, energéticos e chá preto e
outras infusões que contêm cafeína à noite.

• Atividade física é uma boa, mas
não próximo ao momento de dormir: pratique exercícios com regularidade, mas
respeite um intervalo de pelo menos quatro horas antes do horário de dormir.

• Mantenha o local de dormir
ventilado, silencioso e escuro. Procure deixar numa temperatura adequada e
confortável. Ambientes muito quentes ou frios podem dificultar o início do sono
ou provocar despertares durante a noite.

• Verifique seu travesseiro e o
colchão, pois a vida útil da maioria deles é de oito a dez anos.

• Evite as bebidas alcoólicas –
elas podem causar um relaxamento nas primeiras horas de ingestão, entretanto,
ao longo da noite, provocam fragmentação do sono e redução de fases mais
profundas de sono. Além disto, o relaxamento do álcool pode agravar o ronco. O
tabagismo também prejudica o sono.

• Para aqueles que preferem um
cochilo durante o dia, este deve ser curto, no máximo 20 a 30 minutos e após o
almoço.

• Evite o uso de medicações para
o sono sem a prescrição médica, pois podem causar efeitos indesejáveis e
negativos. A ajuda de um profissional é fundamental.

 

Edição: Kleber Sampaio

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