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Grupo de familiares de vítimas da Kiss pretende processar Netflix por série sobre a tragédia

Última atualização 29 de janeiro de 2023 - 08:33:09

Pedro Sol (Luís), Raquel Karro (Lívia) e Paulo Gorgulho (Ricardo) interpretam a família de Marco (Sandro Aliprandini) em “Todo Dia a Mesma Noite” Guilherme Leporace/Netflix / Divulgação

Um movimento formado por pais de
vítimas e também moradores de Santa Maria está revoltado com a exibição da
série Todo Dia a Mesma Noite, disponível na Netflix. Segundo o coordenador do
grupo, o sentimento é de indignação e injustiça. O empresário Eriton Luiz
Tonetto Lopes perdeu uma filha de 19 anos na tragédia, a jovem Évelin Costa
Lopes.

– Nós fomos pegos de surpresa,
ninguém nos avisou, ninguém nos pediu permissão. Nós queremos saber quem está
lucrando com isso. Não admitimos que ninguém ganhe dinheiro em cima da nossa
dor e das mortes dos nossos filhos. Queremos entender quem autorizou, quem foi
avisado, porque muitos de nós não fomos. Há pais passando mal por causa da
série. O mínimo que exigimos agora é que uma parte do lucro seja repassada para
tratamento de sobreviventes e para a construção do memorial da Kiss. Nós não
queremos nenhum dinheiro para nós – afirma Eriton.

Alegando “exploração financeira
da tragédia”, pais e apoiadores começaram uma mobilização e criaram um grupo de
Whatsapp para discutir o assunto. Eles não fazem parte da Associação dos
Familiares de Vítimas e Sobreviventes da Tragédia de Santa Maria. A série Todo
Dia a Mesma Noite, baseada no livro homônimo da jornalista mineira Daniela
Arbex, é uma obra que mistura realidade e ficção, interpretada por atores.

O grupo contratou uma advogada de
Santa Maria para receber orientações jurídicas, conduzir o caso e questionar a destinação
do dinheiro arrecadado pela Netflix. Segundo Juliane Muller Korb, o ponto
crucial é abordar a responsabilidade afetiva e social dos streamings.

– Todas as famílias sentem a
mesma dor, mas de forma distinta, inclusive em relação a esta série. Todas têm
mágoa com o poder judiciário e com a impunidade até aqui. A grande questão é
que faltou sensibilidade, por parte da Netflix, de fazer um contato com os
pais. Não para pedir permissão nem coibir a licença poética, pois a história
não tem dono, mas para avisar que seria algo totalmente diferente de tudo que
eles já viram. Eles estavam preparados para um documentário, não para uma série
dramática. Os pais e os sobreviventes estão “acostumados” a ver
materiais jornalísticos, com reproduções e relatos fidedignos. Mas a série é
diferente. O impacto foi muito forte porque é uma simulação, uma reprodução,
com rostos diferentes, com atores. Eles estão “acostumados” com o
pós-tragédia. E a série mostra o antes, então, é como se ocorresse de novo. É
uma linha muito tênue entre ficção e realidade – explica Juliane.

A advogada acrescenta que seu
papel é fazer a interlocução com a Netflix, tentar um diálogo para que pelo
menos uma parte do lucro seja destinada às vítimas, aos sobreviventes e à
construção do memorial. Ela acredita que seja 
viável ação por danos morais e sequelas médicas, pois, segundo ela, pais
voltaram para a terapia por causa da série. O encaminhamento deve ser feito
ainda nesta semana. Procurada, a Netflix não se manifestou até a publicação desta
reportagem.

A tragédia na boate Kiss
completou 10 anos na sexta-feira (27). O incêndio deixou 242 mortos e 636
feridos.

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