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Comunidade indígena decide que não vai mais para Bandeirante

Última atualização 28 de novembro de 2013 - 06:54:34

REGIÃO

Os Indígenas que compõe a comunidade Guarani e que encontram-se provisoriamente na aldeia Toldo Chimbangue, em Chapecó, decidiram durante essa semana que não vão mais aceitar os acordos feitos para a instalação da comunidade no município de Bandeirante. Uma carta escrita nesta semana pela comunidade revela o repúdio dos indígenas com alguns parlamentares federais e estaduais de Santa Catarina.

O Cacique Marco Mariano de Morais, disse a reportagem do Gazeta Catarinense que a carta tem intenção de mostrar o repúdio da comunidade diante de atitudes de parlamentares que, segundo ele, tem impedido o avanço da demarcação das terras no Araça’í, área que comprende parte dos territórios dos municípios de Cunha Porã e Saudades, hoje habitado por cerca de 120 agricultores, mas que é reivindicado pelo povo indígena na justiça. Mariano enfatiza ainda que as manifestações feitas pelo governo federal e estadual têm pressionado o Ministério da Justiça e a Fundação Nacional do Índio para não demarcar as terras.

O Coordenador do Concelho Indigenista Missionário (Cimi) da regional Sul, Jacson AntÔnio Lops Santana, revela que a decisão dos indígenas pode ser explicada pelo fato de que existem alguns parlamentares que estão buscando se promover ao retirar a comunidade de perto do Araça’í.

Santana informa que a comunidade não vai se retirar do local onde estão até que a demarcação física do território do Araça’í não aconteça. Segundo ele, o governo quer implantar uma estratégia de afastamento dos indígenas da localidade. “Com os indígenas morando em Bandeirante, ficarão afastados das discussões sobre a demarcação das terras em questão e das políticas públicas. Por essa razão também, o Cimi apoia a decisão dos indígenas em não querer transferir a comunidade para Bandeirante”, destaca.

A última ofensiva aos indígenas, segundo consta na carta de repúdio, é um acordo assinado sem a presença da comunidade indígena, na compra da área de terra no município de Bandeirante. Morais declara que a comunidade não admite o acordo feito, que segundo ele, é coordenado pelo deputado estadual Dirceu Dresch (PT) e o secretário da Agricultura do estado de Santa Catarina, João Rodrigues. “Lutamos e sempre lutaremos pela nossa terra tradicional, localizada nos municípios de Saudades e Cunha Porã”, disse Morais.

Na carta, a comunidade indígena relata que a maior responsabilidade pelo conflito ente os indígenas e agricultores é do governo federal que, segundo consta na carta, não tem pretensão de efetivar a demarcação das terras e ainda, converte o meio ambiente, as terras, as águas, as matas, as pessoas em recursos disponíveis para exploração. “A sociedade precisa entender que existem leis para os povos indígenas, e nós não queremos tirar o direito de ninguém, mas existem leis que precisam ser cumpridas, baseado nisso, queremos as terras demarcadas para que possamos sobreviver”, garante Morais.

DRESCH GARANTE QUE CONFLITO SERÁ RESOLVIDO

O Deputado Estadual, Dirceu Dresch (PT) disse à reportagem do Gazeta Catarinense que o conflito que se estabeleceu na região será resolvido. Segundo ele, tanto os agricultores quanto os indígenas não serão prejudicados. “Estamos muito tranquilos e acreditamos ser possível deixar os dois lados bem. Achamos que a posição da comunidade indígena de não se instalar em Bandeirante não é definitiva”, acredita.

Dresch defende que o documento assinado pelos indígenas, Funai e Ministério Público garante a resolução da problemática e instalação da comunidade em Bandeirante. “Vamos continuar cobrando do estado a efetivação da compra de terra em Bandeirante para resolver à problemática”, informa.

GOVERNO PODE VOLTAR ATRÁS NA COMPRA DE TERRA

Procurado por nossa reportagem, o Secretário da Agricultura do Estado de Santa Catarina, João Rodrigues, disse que se os indígenas não quiserem mais alocar a comunidade no município de Bandeirante, a compra da área de terra precisará ser analisada. “O estado está atendendo ao pedido dos indígenas e dos agricultores, adquirimos a área de terra que não é nossa obrigação, estamos investindo. Os indígenas assinaram uma ata e a gente vai precisar conversar para acertar essa situação”, explica.

Uma nota enviada a imprensa pelo Ministério Público nesta semana referente ao ciclo de visita às terras indígenas, informou que com relação à comunidade Guarani do Araça'í, a prioridade do MP relatada, é o início das medições da área demarcada e maior celeridade da ação judicial relativa à questão, favorável aos indígenas em primeira instãncia.

Nesse sentido, o cacique da tribo defende que a comunidade exija que a Funai faça a demarcação física das terras. “Exigimos também que o governo do estado assuma toda a responsabilidade sobre o erro cometido no passado, regulamentando uma lei que já foi aprovada na Assembleia Legislativa de nosso estado”, finaliza. A carta de repúdio está sendo encaminhada para todos os órgãos envolvidos no processo de demarcação das terras indígenas.

VEJA A CARTA NA ÍNTEGRA

Nota dos Guarani da Terra Indígena Araçá'i: “Não aceitamos acordos políticos em troca de nossa terra tradicional”

Nós Guarani da terra indígena Araçá´í denunciamos as manobras políticas que estão sendo arquitetadas por parlamentares de Santa Catarina, com o intuito de impedir o avanço da demarcação de nossa terra tradicional, pressionando o Ministério da Justiça, a Fundação Nacional do Índio para não demarcar nossa terra. Além disso, tentam nos convencer de que mudarmos para uma outra área provisória é a melhor saída. Com isso instigam, promovem e fomentam, nas regiões, manifestações contrárias a demarcação de nossa terra, alimentando o ódio e o preconceito da sociedade contra nós.

Denunciamos as estratégias desses políticos de estarem organizando estas ações. A última ofensiva é um acordo assinado sem nossa presença, na compra de uma área em Bandeirantes, no extremo oeste. Não admitimos este acordo feito, coordenado pelo deputado estadual Dirceu Dresch e o secretário da Agricultura do Estado de Santa Catarina, João Rodrigues. Lutamos e sempre lutaremos pela nossa terra tradicional, localizada nos municípios de Saudades e Cunha Porã.

A postura anti indígena desses políticos, que até recentemente estavam na oposição e se manifestavam favoráveis aos nossos direitos, tem, no nosso entender, duas possíveis explicações: primeiro, querem transformar a questão indígena em palanque eleitoral para as eleiçõesde 2014, com isso arrebanhar os votos de uma grande parcela da população que não aceita os povos indígenas como sujeitos e cidadãos detentores de direitos (preconceito histórico existente na região); segundo, políticos considerados de esquerda não compreendem, e talvez nunca compreenderam arealidade cultural de nossa região e a que tudo indica, não têm firmeza ideológica acercada sociedade que se pretende construir e conseqüentemente são cooptados aos interesses econÔmicos e políticos.

Reivindicamos nossa terra tradicional desde 1998, sofrendo situações extremas ao longo destes quinze anos: desde a retomada que fizemos e a expulsão que sofremos de nossa terra no ano 2000, até a proibição judicial de retornar ao estado de Santa Catarina no mesmo período.Desde 2001, estamos vivendo sob 08 hectares da terra indígena Toldo Chimbangue, do povo Kaingang, no município de Chapecó. O reduzido espaço ocupado não permite o cultivo suficiente para garantir a alimentação na aldeia. Com isso, a dependência da assistência dos órgãos governamentais é acentuada.Entretanto, esta assistência tem sido falha e as conseqüências são visíveis.

A maior responsabilidade por essa situação de violência édo Governo Federal que, além de não realizar a demarcação de nossa terra, vem assumindo abertamente e sem pudor uma política desenvolvimentista que converte o meio ambiente, as terras, as águas, as matas, as pessoas em recursos disponíveis para exploração.

Nos, guarani do Araçá´í, exigimos que a Funai faça a demarcação física de nossa terra. E que o Governo do estado de Santa Catarina assuma de uma vez por toda a responsabilidade sobre o erro cometido no passado, regulamentando uma lei que já foi aprovada na Assembleia Legislativa de nosso Estado.

Caso o Governo Federal mantenha uma atitude de descaso e omissão diante da grave situação vivida pelo nosso povo, será diretamente responsabilizado pelas violências e por qualquer confronto que por ventura venha a ocorrer.

Comunidade Guarani do Araçá´i

Terra Indígena Toldo Chimbangue

26 de novembro de 2013.


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