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Convivência 24 horas e falta de vida social alavancam aumento de divórcios na pandemia em SC

Última atualização 6 de março de 2022 - 10:54:43

No primeiro ano de pandemia da Covid-19, o número de
divórcios aumentou em Santa Catarina. Para profissionais que lidam com os
casais nos momentos de crise, a convivência 24 horas por conta do isolamento e
a falta de vida social independente potencializaram a alta de pedidos de
separação.

O Estado teve recorde de divórcios em 2020 com 13.826
pedidos  concedidos, o sexto maior número
do Brasil. O aumento nas solicitações foi o terceiro maior do país.

Uma das separações foi a de Laura Bosenbecker, professora de
inglês de 34 anos que mora em Florianópolis. A relação de seis anos que já
enfrentava problemas terminou de forma definitiva em novembro do primeiro ano
de pandemia.

“Tinham questões que já existiam há anos, mas com a pandemia
eu acho que comecei a ver coisas mais presentes, que anteriormente eu não via
porque não estava em casa”, relata ela.

Antes da crise sanitária, a professora tinha dois empregos
em escolas diferentes, o que a deixava ocupada durante a semana. Ela ficava
menos tempo em casa do que seu ex-companheiro, que na época não trabalhava. Na
pandemia, o cenário mudou.

O isolamento social e o home office foram marcas de um ano
atípico, que manteve boa parte da população dentro das residências para
garantir a proteção contra o coronavírus. Com isso, a convivência dos casais
aumentou e alguns problemas também.

Ana Paula de Oliveira Antunes, vice-presidente da Comissão
de Direito de Família da OAB/SC, confirma que o convívio 24 horas e a
impossibilidade de ter outras interações sociais foram fatores que
influenciaram a alta de separações.

“As pessoas tinham suas vidas, tempo com os amigos, academia
e projetos pessoais individuais. Tinham como circular, ter mais lazer e, de
certa forma, elas estabeleciam uma rotina familiar que era conjunta, mas que
tinha um momento de independência. Com a pandemia, isso acabou”, afirma.

Segundo a psicóloga Kátia Christine Teichmann, a
possibilidade de sair do mesmo ambiente, e aliviar a tensão que a convivência
pode gerar, tornava muitas relações mais fáceis de lidar.

Nesse novo contexto, alguns relacionamentos chegaram ao fim
por motivos já conhecidos, mas que se intensificaram no período de reclusão
dentro das casas, como aconteceu com Bosenbecker.

Reorganização do espaço da casa

A residência virou local de lazer, exercício, trabalho e
estudo de toda a família. Para a psicóloga, essa readaptação do local de
convivência também influenciou as relações. 

“A gente precisava resolver tudo no mesmo espaço físico.
Disputar para ver quem fica com o melhor lugar para realizar home office, por
exemplo”, cita Teichmann.

Algumas pessoas tiveram um crescimento no meio profissional,
com mais serviço no trabalho remoto. Para outras, a gestão das crianças dentro
de casa era a maior preocupação.

Em cenários que envolviam as duas questões, algumas relações
foram mais prejudicadas. “Muitas vezes o casal, mesmo com muito amor, não dá
conta de sustentar tantas demandas”, garante a psicóloga.

A busca por ajuda

A ansiedade e sobrecarga de trabalho por conta das mudanças
com as aulas online afetaram a professora de inglês, que terminou o casamento
em 2020.

Ao se sentir emocionalmente abalada com a pressão
profissional, ela iniciou um acompanhamento de terapia psicológica para
resolver as questões, mas a experiência foi fundamental para ela se preparar
para a separação.

“Talvez se eu não tivesse começado a terapia, não teria
visto tudo que estava acontecendo tão de perto. E então teria me prolongado
naquele relacionamento por mais algum tempo”, reflete Bosenbecker.

Independência como força emancipadora

No caso da professora, a independência financeira e
emocional foram parte importante durante o divórcio. A autonomia de ter a
própria renda e autossuficiência na parte social deram segurança para terminar
a relação de uma vez.

“Sempre tive essa independência e depois, com tudo que foi
acontecendo, eu percebi que não preciso estar em um relacionamento que eu não
quero mais estar”, relembra Bosenbecker.

Crises dentro de uma pandemia

No desenvolvimento da vida em família, novos desafios e
rearranjos são necessários. Segundo a psicóloga, crises são normais, todos os
casais passam por elas, mas o contexto pode potencializar brigas e
desentendimentos.

Para Teichmann, “quando a crise está atravessada por uma
pandemia, as coisas ficam ainda mais difíceis. As crises acabam se
transformando em conflitos muito difíceis de administrar.”

A violência dentro de quatro paredes

Outro fator que alavancou o número de divórcios foi a
violência de gênero contra mulheres, segundo a advogada. Com o confinamento dos
parceiros dentro das residências, o aumento no número de agressões ou da
gravidade das situações levou muitos relacionamentos abusivos ao fim.

“Teve um aumento enorme de violência doméstica. E aumento
das denúncias e protestos judiciais, o que acarretou em uma série de
consequências na esfera do direito de família, principalmente em relação aos
divórcios”, garante Oliveira.

Em 2020, 59 mulheres morreram vítimas de feminicídio em
Santa Catarina. O número representa a estatística alarmante de uma morte por
semana. Muitos dos casos aconteceram após situações de agressão por parte do
esposo, namorado ou ex-companheiro da vítima.

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