Home Tribunal de Justiça silencia sobre soltura de condenado a 29 anos de prisão por assassinato, em Florianópolis

Tribunal de Justiça silencia sobre soltura de condenado a 29 anos de prisão por assassinato, em Florianópolis

Última atualização 3 de dezembro de 2012 - 14:14:21

Está prevista para esta segunda-feira ou terça-feira a publicação do acórdão do Tribunal de Justiça de Santa Catarina (TJSC) com as razões sobre a polêmica soltura dada na última quinta-feira a Nelson de Oliveira Júnior, o Buca, condenado a 29 anos por assassinato, tentativa de homicídio e formação de quadrilha.

Os desembargadores responsáveis pela decisão disseram pela assessoria de imprensa que não vão dar entrevistas por impedimento legal no caso. A manifestação será apenas pelo acórdão, o documento legal no qual o colegiado de instãncia superior externa o seu posicionamento.

Segundo o TJSC, a liberdade foi concedida em habeas-corpus julgado pela 4ª Cãmara Criminal. Votaram pela concessão da liberdade os desembargadores Roberto Lucas Pacheco e Jorge Schaefer Martins, que preside a 4ª Cãmara. O relator foi o desembargador-substituto, juiz Rodrigo Collaço, que votou contra a liberdade e foi vencido pelos votos dos colegas.

No TJSC, a assessoria afirmou ainda que o presidente do tribunal, desembargador Cláudio Barreto Dutra, também não se manifestaria, nem sobre a soltura nem sobre as declarações dadas ao DC pelo promotor Onofre José Agostini, coordenador do Centro de Apoio Operacional Criminal do Ministério Público de Santa Catarina.

Em entrevista publicada no sábado, Onofre se disse indignado com a concessão do habeas-corpus pela periculosidade do criminoso e os crimes pelos quais foi condenado. O promotor fez críticas a segmentos do Judiciário, os quais disse que não estariam compromissados com a realidade criminal que se vive no Estado.

A soltura causou ainda mais surpresa porque as autoridades afirmam que o réu tem perfil de reincidência ao crime e fez ameaças no próprio julgamento em que foi condenado a 29 anos de prisão, no dia 23 de outubro. Nelson, 31 anos,é filho do traficante falecido Xeca-Xeca.

O juiz da Vara do Tribunal do Júri, Paulo Marcos de Farias, em decisão que o DC teve acesso, confirma as supostas ameaças que o criminoso teria feito ao ser julgado. O magistrado diz que Nelson teve comportamento extremamente reprovável, gritando, juntamente com seus familiares, “justiça, justiça, vocês têm família”.

As palavras, ressalta o juiz, foram dirigidas ao jurados e demais presentes na sessão como um desabafo em tom de ameaça.

O advogado Francisco Campos, defensor de Nelson, nega que o seu cliente tenha feito ameaças e diz que ele fez um clamor por justiça, reagindo como se sentindo injustiçado.

Ele reafirmou que seu cliente é inocente. Sobre a possibilidade de seu cliente fugir, o advogado disse que Nelson tem residência fixa e carteira de trabalho assinada e quem não quer ser encontrado não cria esse tipo vínculo.

Solto de forma equivocada em 2009

Esta não é a primeira vez que Nelson de Oliveira Junior aparece em meio a impasses judiciais.

Em 2009, ganhou liberdade por um equívoco da então administração da Penitenciária de Chapecó, no Oeste, onde cumpria pena, conforme registra o juiz José Everaldo Silva, que coopera na 4ª Cãmara Criminal, em decisão em que votou por negar habeas-corpus.

Nelson havia sido beneficiado por livramento condicional num processo que respondia por tráfico. Só que tinha mandado de prisão preventiva por outro processo, o de assassinato, e deveria ter ficado preso.

Na sentença pelo assassinato de Rudinei de Moraes Cardoso, o juiz da Vara do Tribunal do Júri da Capital, Paulo Marcos de Farias, lembra que Nelson “passou longo período como foragido, jamais dando endereço certo e que jamais se prontificou a vir ao processo enquanto corria risco de ser detido, o que demonstra que, caso em liberdade, pode mais uma vez rumar para local incerto, impedindo, por óbvio, o cumprimento da pena hoje estabelecida”.

ENTREVISTA: Sérgio Luiz Junkes, juiz presidente da Associação dos Magistrados Catarinenses

Hoje, apesar da onda de violência, a prisão é uma exceção e não regra, observa o juiz Sérgio Junkes, em entrevista dada neste domingo por e-mail.

Diário Catarinense- Como explicar uma decisão em que o Judiciário solta um traficante condenado a 29 anos de prisão por assassinato, tentativa de homicídio e formação de quadrilha?
Sérgio Junkes-
O entendimento predominante é de que se o réu cumpre a pena em liberdade, comparece em juízo espontaneamente quando intimado, não comete nenhum delito neste espaço de tempo até o trãnsito em julgado, ele deve permanecer solto. Compreendemos a repercussão, mas, infelizmente, os juízes também estão atrelados a um modelo que coloca a prisão como exceção, não como regra, com base, justamente, no princípio da presunção da inocência.

DC- O promotor Onofre Agostini se disse indignado e afirmou que há um descompromisso de segmentos do Judiciário. Qual a sua opinião sobre a declaração?
Junkes-
Discordamos. A Justiça catarinense tem sido extremamente rigorosa neste aspecto, tanto que os presídios estão lotados e existem atualmente mais de 12 mil mandados de prisão em aberto.

DC- O promotor também afirma que é muito mais fácil fundamentar a decisão de libertar do que a de prender. O senhor concorda?
Junkes-
A decisão acerca da privação de liberdade ou não exige um exame minucioso do juiz. Pela lei brasileira, a prisão é uma exceção e o juiz para decretá-la precisa justificar expressamente essas circunstãncias. Infelizmente, o legislador optou por afrouxar a lei, ante as alegadas dificuldades do Estado para construir mais presídios.


Confira o resumo do habeas-corpus publicado no site do Tribunal de Justiça:

29/11/2012 às 09:00 Julgamento por Acórdão

Decisão: por maioria de votos, conceder a ordem, expedindo-se alvará de soltura em favor do paciente, se por outro motivo não estiver preso, fixando-se a medida cautelar prevista no art. 319, IV do CPP de não ausentar-se da comarca sem autorização judicial e facultando-se à Autoridade Judiciária de Primeiro Grau a aplicação de outras medidas cautelares previstas nos incisos do art. 319 do Código de Processo Penal que entender pertinentes ao caso concreto, vencido o relator que votou pela denegação da ordem.

Veja decisão do juiz da Vara do Júri após a soltura do criminoso em que consta as ameaças que teria feito no julgamento:

Comarca da Capital — Vara do Tribunal do Júri

Autos n. 023.05.024094-6

DECISÃO

1. Na presente ação penal, após ser o denunciado Nelson de Oliveira Júnior condenado à pena de 29 anos de reclusão, em regime fechado, houve por bem o Tribunal de Justiça conceder a ordem em sede de Habeas Corpus, determinando a sua soltura. Registrou-se que não pode Nelson ausentar-se da comarca, sendo facultada a adoção de outras medidas estabelecidas no art. 319 do CPP a critério deste juízo. Como já consignado, inclusive nas informações prestadas ao HC, ao fim da sessão de julgamento, ao ter conhecimento da condenação, Nelson teve comportamento extremamente reprovável, gritando, juntamente com seus familiares, “justiça, justiça, vocês têm família”. As palavras eram dirigidas aos jurados, bem como aos demais presentes, ficando caracterizado, data maxima venia, um desabafo em tom de ameaça. Ainda que este quadro não importe, segundo a instãncia superior, na necessidade da segregação, entendo como cabível medidas mais concretas no sentido de resguardar a segurança de todos, seja da sociedade, seja dos jurados, seja das autoridades que participaram daquela sessão.

2. Com estas considerações, e na forma do art. 319 do Código de Processo Penal, determino a imediata soltura do réu Nelson de Oliveira Júnior, que deverá, ao assinar o respectivo alvará ser intimado das seguintes condições: I — não se ausentar da comarca sem autorização deste juízo; II — comparecer quinzenalmente ao Fórum local para subscrever termo; III — recolher-se em seu domicílio no período noturno e nos dias de folga.

Dê-se ciência ao Ministério Público e à autoridade policial, que auxiliará no cumprimento das medidas.

Capital, 29 de novembro de 2012.

Paulo Marcos de Farias

Juiz de Direito

deixe seu comentário